sábado, 7 de novembro de 2009

O Começo da Bossa Nova

Como tudo começou, segundo Vina:

"Tom, um dia, de volta da montanha, chegou à minha casa, na rua Henrique Dumont, sentou-se ao meu lado e, depois de um papo manso, pegou meu vilão e pôs-se a tocar um sambinha que logo me alertou o ouvido...
Tom repetiu-se umas dez vezes. Era uma graça total, como um tecido melancólico e plangente; e bastante "chorinho lento" no meu espírito. Eu fiquei de saída com a melodia no ouvido, e vivia a cantarolá-la dentro de casa, a espera de uma deixa para a poesia. Aquilo, sim, me parecia uma música realmente nova, original, inteiramente diversa de tudo que viera antes dela, mas tão brasileira quanto qualquer choro do Pixinguinha ou samba de Cartola. Um samba todo em voltas, onde cada compasso era uma queixa de amor, cada nota uma saudade de alguém longe.
Mas a letra não vinha, (...) eu já estava ficando furioso, pois Tom, embora não me telefonasse reclamando nada, estava esperando pelo resultado.
Uma manhã, depois da praia, subitamente a revolução chegou. Fiquei tão contente que cheguei a dar um berro de alegria, para grande susto de minhas duas filhinhas (...) Queria, depois dos sambas de Orfeu, apresentar ao meu parceiro uma letra digna de sua nova música; pois eu realmnete a sentia nova, caminhando numa direção a que não saberia dar nome ainda, mas cujo nome já estava implícito na criação. Era realmente a bossa nova que nascia, a pedir apenas na sua interpretação, a divisão que João Gilberto descobriria logo depois.
Intitulei-o Chega de Saudade recorrendo a um dos seus versos...

["Diário Carioca", 29/01/1965]